A globalização é um fenômeno que define o cenário contemporâneo, interligando nações e culturas de maneira nunca vista antes. No entanto, esse processo também abre portas para a expansão da criminalidade transnacional, que explora as vulnerabilidades geradas pela proximidade entre países e povos. Organizações criminosas se aproveitam de Estados com instituições frágeis ou corruptas para facilitar atividades ilícitas, como lavagem de dinheiro, falsificação de documentos e o tráfico ilegal de pessoas e mercadorias. Essas ações não afetam apenas os países diretamente envolvidos, mas também geram redes criminosas que desafiam a eficácia dos sistemas de segurança pública a nível global.
Nesse contexto, a integração das forças policiais entre os países se torna crucial para combater a criminalidade transnacional, que transcende fronteiras e se aproveita das disparidades entre sistemas legais e de segurança. A cooperação internacional possibilita o compartilhamento de informações, recursos e estratégias, tornando as investigações mais eficientes e permitindo ações coordenadas contra organizações criminosas que operam em diversas regiões. Em um mundo cada vez mais globalizado, a colaboração entre as forças policiais é essencial para garantir a proteção das populações e a integridade dos sistemas legais.
A Cooperação Internacional como Resposta Necessária
No Brasil, a Polícia Federal desempenha um papel principal na cooperação internacional, atuando como Autoridade Central e representando o país em operações conjuntas. Segundo Nunes (2017), operações como a Lava Jato demonstram como a cooperação jurídica internacional e o compartilhamento de informações são essenciais para rastrear bilhões de reais desviados e ocultados em paraísos fiscais. Costa e Soares (2017) apontam que a eficácia dessa cooperação está atrelada à existência de acordos bilaterais sólidos, além da confiança mútua entre os países envolvidos. Sousa (2019) observa que, embora os avanços nas parcerias internacionais tenham sido significativos, a burocracia excessiva e as diferenças nos sistemas jurídicos ainda retardam o processo de recuperação de ativos. Complementando essa perspectiva, Castro (2019) ressalta que o compartilhamento de dados financeiros entre as nações envolvidas foi um dos pilares do sucesso da Lava Jato, especialmente no rastreamento de recursos ocultos em paraísos fiscais.
Diante dessa realidade, a integração das forças policiais em nível nacional e internacional tornou-se imperativa. Organizações como a Interpol e a Europol têm se destacado como pilares dessa colaboração. A Interpol, composta por 195 países membros, oferece tecnologias como o I-24/7, que permite a troca de informações em tempo real entre as polícias, além de emitir notificações, como as Difusões Vermelhas, essenciais para localizar suspeitos e combater a fuga internacional de criminosos (Castro, 2019). Lima Filho (2024) amplia essa discussão ao defender que, apesar dos progressos alcançados, há uma necessidade urgente de harmonizar procedimentos jurídicos e melhorar a infraestrutura tecnológica que sustenta essa cooperação. Enquanto Sousa (2019) enfatiza a importância de tratados internacionais ágeis, Costa e Soares (2017) sugerem o investimento em treinamento de agentes públicos para lidar com sistemas jurídicos estrangeiros. Castro (2019) alerta ainda para o risco de interferências políticas no processo de cooperação, que podem comprometer os avanços obtidos. Em suma, os autores concordam que a estrutura de cooperação internacional precisa ser aprimorada, mesmo que cada um destaque diferentes aspectos desse processo.
Estados Frágeis e a Expansão do Crime Transnacional
Estados com governança débil são frequentemente explorados por organizações criminosas. Como por exemplo a Venzuela, organizações criminosas utilizam serviços públicos, como cartórios e sistemas financeiros, para falsificar documentos e ocultar transações financeiras ilícitas, ampliando suas operações internacionais. João Renato, policial penal do Distrito Federal e mestre em Direito e Políticas Públicas, ressalta que “a corrupção e a falta de estrutura estatal transformam esses países em bases estratégicas para crimes transnacionais, exigindo uma resposta coordenada e integrada das forças de segurança dos países que ainda detém de credibilidade das suas instituições”.
Ele também aponta a necessidade de abordar o problema com um enfoque preventivo, fortalecendo as instituições públicas para reduzir sua vulnerabilidade ao crime organizado. “É indispensável investir na capacitação de policiais, inclusive em habilidades de comunicação internacional, para que possam atuar em um cenário global cada vez mais complexo”, afirma João Renato.
A Capacitação em Língua Inglesa como Ferramenta Estratégica
A língua inglesa é a mais utilizada nas comunicações internacionais entre forças policiais, tornando sua proficiência uma habilidade essencial para operações conjuntas. Doutor Micael Jardim, especialista em inglês para executivos e fundador da Lingualize, afirma que “o domínio do inglês vai além da tradução literal de termos técnicos. É essencial para negociar em situações de crise, interpretar nuances culturais e conduzir investigações com eficácia no cenário global”. Ele já treinou profissionais que colaboram diretamente com o FBI e a Interpol, destacando que a capacitação contínua pode posicionar os policiais brasileiros em destaque no cenário internacional.
Superando Barreiras Institucionais
Apesar de avanços, barreiras como reservas de competências, falta de interoperabilidade e ausência de uma cultura integrada ainda limitam o potencial das forças de segurança. Como aponta Ricardo Salgueiro (2023), a modernização e organização do crime exigem que as instituições superem essas divisões históricas e adotem uma abordagem cooperativa e estratégica.
No Brasil, o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), instituído pela Lei nº 13.675/2018, foi um marco legal importante. Ele promove a coordenação entre as forças de segurança e incentiva o compartilhamento de informações e a interoperabilidade dos sistemas de dados (Salgueiro, 2023).
A Importância do Networking nos WPFG
Além da capacitação técnica, eventos como os World Police and Fire Games (WPFG) desempenham um papel estratégico no fortalecimento da integração global. Realizados bienalmente, os WPFG reúnem milhares de agentes de segurança de todo o mundo, promovendo não apenas competições esportivas, mas também a troca de experiências e o estabelecimento de redes de contatos. A edição de 2023, em Winnipeg, Canadá, destacou a relevância do Brasil ao conquistar mais de 100 medalhas, demonstrando a capacidade técnica e o potencial dos profissionais brasileiros no cenário internacional.
Conclusão
Os estudos analisados convergem na compreensão de que a integração das forças policiais é vital para combater a criminalidade transnacional. Salgueiro (2023) aponta que, apesar de avanços operacionais, lacunas na interoperabilidade estratégica e barreiras culturais ainda limitam a eficácia das operações. Ele reforça a importância de superar entraves históricos e investir em coordenação efetiva.
Por sua vez, Scandolara (2022) destaca a necessidade de institucionalizar práticas cooperativas, seja por meio de tratados e acordos ou de abordagens informais, como treinamentos e intercâmbios profissionais. Ele enfatiza o papel das tecnologias avançadas e da reestruturação organizacional para lidar com crimes globalizados.
A experiência de João Renato, enriquecida por sua atuação prática e acadêmica, reforça a necessidade de fortalecimento institucional e capacitação contínua de policiais, especialmente em habilidades como o domínio da língua inglesa. Ele conclui que, sem instituições sólidas e profissionais capacitados, a resposta ao crime transnacional será limitada.
Portanto, a integração efetiva exige mais do que tecnologia e ferramentas avançadas: é necessário investir na capacitação contínua, incluindo o aprendizado do inglês como língua estratégica, e no fortalecimento do networking global em eventos como os WPFG. Com esses elementos, as forças de segurança podem ampliar sua capacidade de enfrentar as complexas ameaças do mundo globalizado.
Referências
Castro, R. (2019). Cooperação jurídica internacional e recuperação de ativos no Brasil. Editora Jurídica Brasileira.
Costa, J., & Soares, G. H. (2017). Acordos bilaterais e desafios na recuperação de ativos desviados: uma análise da Lava Jato. Revista Brasileira de Direito Internacional, 14(1), 12-29.
Lima Filho, P. F. (2024). Harmonização jurídica internacional e os desafios da Lava Jato no Brasil. Revista de Estudos Jurídicos Comparados, 11(1), 34-51.
Nunes, L. B. (2017). Cooperação internacional e combate à corrupção: O caso da Operação Lava Jato. Revista de Direito Penal e Econômico, 9(3), 45-62.
Salgueiro, R. B. (2023). O papel da gestão integrada no combate aos crimes transfronteiriços. Revista (Re)Definições das Fronteiras, Foz do Iguaçu.
Scandolara, R. P. (2022). Cooperação policial internacional: Processos de institucionalização de práticas internacionais pela Polícia Civil do Estado de Santa Catarina. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina.
Sousa, R. (2019). A burocracia na cooperação jurídica internacional: um entrave à recuperação de ativos ilícitos. Revista de Direito Global, 8(2), 78-94.
Colaboração
João Renato B. Abreu, Policial Penal – DF, mestre em direito e políticas públicas, pós-graduado em direito penal e controle social, coordenador do NISP – Novas Ideias em Segurança Pública, faixa preta de jiu jitsu e autor do livro: Plea Bragaining?! Debate legislativo – Procedimento abreviado pelo acordo de culpa. @joaorenato.br e publicado originalmente na Rádio Corredor.